25/11/2007


Mauro Almeida
  Os usos ritualizados da bebida conhecida entre outros nomes como “ayahuasca” saíram do âmbito das sociedades indígenas amazônicas para se difundirem, seja entre seringueiros na floresta, seja sessões de cura de vegetalistas andinos, seja em cultos urbanos espalhadas pelo Brasil e pelo mundo.

  Esse e o fenômeno que este livro aborda, com um quadro ao mesmo tempo comparativo e multidisciplinar, cheio de informações e de perspectivas. Certamente suscita muitas questões de análise e interpretação, motivadas entre outras razões pelo fato de tratar em um só volume do xamanismo indígena sul-americano, das religiões criadas por seringueiros da Amazônia, e do uso de plantas de poder associado a práticas terapêuticas e ao chamado neo-xamanismo.

  Esse volume retoma o estado da arte desse conjunto de questões. Ele trata principalmente do que Jean Langdon (1988) chamou de “xamanismo genérico”, e da re-utilizaçao das plantas psicoativas de origem indígena e sul-americana em diferentes contextos culturais. Esse ponto deve ser destacado, pois embora o livro contenha expressivas contribuições à etnologia indígena (nos artigos de Jean Langdon, Barbara Keifenheim e Pedro Luz), a sua contribuição mais extensiva são os capítulos que mapeiam o que Beatriz Labate chamou de campo das religiões ayahuasqueiras brasileiras e suas ramificações neo-xamánicas.

  Talvez sejam cabíveis alguns comentários sobre as relações entre esses vários contextos, sobre as quais o volume nos convida a refletir. A ayahuasca e bebidas similares são utilizadas por diferentes populações indígenas em um arco que vai das nascentes do Ucayali às cabeceiras do Rio Negro. Ao longo desse arco habitado por povos de refinada farmacologia e ricas cosmologias, povos indígenas dos troncos lingüísticos Pano, Aruák e Tukano parecem compartilhar uma filosofia da natureza segundo a qual existem diferentes espíritos encarnados nas pessoas, nos animais e nas plantas, alguns ligados ao corpo e outros separáveis dele - como mostram Pedro Luz, Jean Langdon e Barbara Keifenheim neste volume. Os xamãs teriam a capacidade de ver esses espíritos e de se transformarem eles próprios em diferentes seres. O capítulo de Barbara Keifenheim enfatiza o fato de que tal capacidade, ajudada pelos similares da ayahuasca, não é privilégio de xamãs. Xamãs e não-xamãs utilizam-se da ayahuasca (nixi pae, yahe, kamarampi, caapi) como operadores que, agindo sobre o corpo, permitem o trânsito entre o mundo ordinário e a realidade verdadeira onde vivem os espíritos, como no sonho e na morte; mas, ao contrário do que ocorre na morte, de maneira reversível, e ao contrário do que ocorre no sonho, de maneira controlada. As substãncias psicoativas, portanto, possuem um papel, ao lado dos sonhos, de danças, do canto e de outras técnicas, como operadores que modificam o corpo e a mente, tanto por exacerbar a experiência sensível como ao abrir caminho para viagens no tempo e no espaço e revelar a existência dos seres que habitam o mundo verdadeiro (ver Robin Wright 1998, pp. 75-94; Langdon 1996, p. 28).

  Segundo Eduardo Viveiros de Castro, o perspectivismo ameríndio coloca a ênfase não na oposição entre um mundo visível e um mundo invisível, e sim na idéia de que o mundo humano se prolonga no mundo dos animais e outros seres que chamamos de naturais - sendo então todos, humanos e animais, equivalentes entre si, mas associados a diferentes perspectivas, vinculadas a corpos distintos, a diferentes roupas ou hábitos. O xamã seria então um viajante em trânsito, não entre mundos, mas entre corpos capazes de adotar perspectivas alternadas, todos eles cidadãos de um mesmo mundo (Viveiros de Castro 1996): como se fossem antropólogos capazes de mudar de perspectivas ao se vestirem como os nativos.



A organização deste livro surgiu a partir do 1 CURA, o Primeiro Congresso sobre o Uso Ritual da Ayahuasca, realizado nos dias 4 e 5 de novembro de 1997 no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp. O evento foi idealizado e organizado por Beatriz Caiuby Labate, foi patrocinado pelo Programa de Pós-graduação em Antropologia Social e contou com o apoio do Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas da mesma universidade.
Ayahuasca é uma palavra de origem quíchua e significa liana dos espíritos ou ainda cipó da alma, dos mortos (Luna 1986). O termo é um dos mais utilizados para designar uma bebida psicoativa preparada geralmente com duas plantas (pode haver algumas variações): a liana ou cipó propriamente dito, cujo nome científico é Banisteriopsis caapi, e as folhas do arbusto Psicotria viridis. O objetivo do Congresso era estudar os usos rituais da ayahuasca em diferentes contextos que vão de cerimonias de indígenas sul-americanos a cultos urbanos. Esses usos rituais difundiram-se enormemente nos últimos anos, na América do Sul e em outros continentes, e têm sido pesquisados por um número crescente de estudiosos. O congresso tinha a finalidade básica de aproximar esses pesquisadores da ayahuasca, divulgar o estado da pesquisa sobre o assunto, e contribuir para o melhor conhecimento da ayahuasca e de seus usos rituais.
Durante dois dias, os pesquisadores reunidos debateram em mesas e palestras os aspectos históricos e antropológicos do uso ritual da ayahuasca, como o ritual, a cosmologia e o sincretismo, e trataram de seus aspectos psiquiátricos, psicológicos e legais. Entre os participantes havia antropólogos, historiadores, médicos, psicólogos, psiquiatras e representantes de diversos grupos ayahuasqueiros, além de um representante do Conselho Federal de Entorpecentes (CONFEN), oriundos de diferentes regiões do país e do exterior, O intuito era, justamente, colocar em contato estudiosos das mais diversas áreas, permitindo uma abordagem de fato interdisciplinar e que fosse capaz de dar conta das múltiplas dimensões envolvidas no uso ritual de psicoativos por grupos humanos.
O livro nasceu do projeto de reunir as conferências apresentadas no encontro. Entretanto, acabou ganhando conteúdo e volume mais amplo, já que mais da metade dos capítulos agora publicados foram escritos por pesquisadores que não participaram do evento.
A presente publicação, dando continuidade à tarefa iniciada no 1 CURA, visa antes de mais nada promover uma abordagem aprofundada de um assunto que é muitas vezes tratado pelos meios de comunicação com enfoques superficiais e simplificadores, que em nada contribuem para a compreensão de um fenômeno com a complexidade própria dos usos rituais da ayahuasca.
Um dos nossos objetivos é mostrar essa complexidade, com um panorama do “estado da arte” da pesquisa sobre o tema, dando ao leitor a oportunidade de tomar contato com o que tem sido produzido sobre temas que vão desde o uso da ayahuasca entre povos da floresta - populações indígenas, curandeiros e seringueiros até os usos da bebida por doutrinas religiosas urbanas como o Alto Santo, o LEFLURIS, a Barquinha e a União do Vegetal, incluindo também análises médicas, psiquiátricas e psicológicas que têm sido realizadas em torno do chá. Ao mesmo tempo, pretendemos incentivar o desenvolvimento deste campo de estudos emergente, chamando a atenção para a necessidade de mais pesquisas na área. Assim, esperamos que o livro seja capaz de seduzir cientistas de diversos campos para os problemas antropológicos, psicológicos e médicos envolvidos neste amplo domínio que estamos denominando como ‘uso ritual da ayahuasca’.
Por último, gostaríamos de frisar que esse é o primeiro esforço sistemático para reunir em uma coletânea no Brasil textos diversos e originais sobre o tema. Esperamos desta forma preencher uma lacuna neste cenário composto de um lado por grande diversidade empírica e de outro por pouca articulação e diálogo entre pesquisadores.
A primeira parte da obra, Ayahuasca entre os Povos da Floresta, é constituída por sete artigos que tratam de usos da bebida por indígenas da floresta amazônica (Pedro Luz, Jean Langdon e Barbara Keifenheim), curandeiros e xamãs no sopé andino (German Zuluaga, Jacques Mabit e Luis Eduardo Luna) e seringueiros do Acre (Mariana Pantoja Franco e Osmildo Silva da Conceição).


Esther Jean Langdon
O uso de Banisteriopsis faz parte, entre os grupos indígenas da região amazônica, de uma experiência cultural e subjetiva e para entender esta experiência, é necessário ir além da análise dos efeitos psicoquímicos desta substância psicointegradora. Para compreender o uso, os efeitos e as possibilidades da Banisteriopsis, é necessário um olhar transdiciplinar. Utilizo a palavra psicointegrador, de acordo com a acepção de Winkelman (1996, p. 11), para me referir a uma abordagem neurofenomenológica que integra neurofisiologia, psicobiologia, estudos de estados alterados de consciência, observações clínicas, estudos etnográficos e comparativos sobre o uso e os efeitos das substâncias trad icionalmente chamadas psicodéllcos ou alucinógenos. A antropologia faz uma contribuição através do seu enfoque cultural; este olhar, porém. não é por mera curiosidade de entender como os outros utilizam estas substâncias. Os grupos Indígenas amazônicos têm utilizado a Banisteríopsis milenarmente para vários fins, e o saber advindo desta experiência milenar não é de se ignorar.
Um dos assuntos poucos explorados na antropologia é como os próprios índios descrevem sua experiência com psicointegradores. Esta experiência é uma construção subjetiva e neurofisiológica mas ao mesmo tempo é permeada de orientações culturais de como percebê-la e interpretá-la. Dado o uso milenar da Banistertopsis, penso que a voz deles nas descrições da experiência é de suma importância para uma abordagem transdisciplinar. É necessário entender o uso e os efeitos de Banisteriopsis como uma experiência mediada pela cultura.
Assim, neste trabalho quero explorar uma narrativa contada por um índio Siona sobre uma experiência que aconteceu na sua aprendizagem como xamã. Apesar de apresentar só texto, este texto é representativo das narrativas em geral desta cultura sobre a “toma” de yagé - a palavra que eles usam para designar as várias misturas feitas de Banisteriops e seus aditivos preparadas para conhecer os lados invisíveis do mundo. Os Siona costumam freqüentemente contar sobre suas experiências com yagé, sobre o que eles viram, o que eles sentiram e o que eles aprenderam. Podemos dizer que estas narrativas fazem parte de uma tradição narrativa e poética (Langdon 1997). Falar sobre suas experiências lhes dá muito prazer e, para que possamos entender melhor a experiência, é necessário ouvi-los da perspectiva psicofenomenológica.
Tomas Banisteripsis ritualmente faz parte do que podemos chamas da recriação da cosmologia xamânica, que nao e limitada a esta substancia nem somente ao xamã, mas que representa um saber englobando toda uma cosmologla e práticas rituais compartilhada pelo grupo. Os Siona, do rio Putumayo no sul da Colômbia, fazem parte de Um complexo xamânico da bacia noroeste da Amazônia, no qual Banisteriopsis é a substância principal para as atividades xamãnicas. Várias pesquisas etnográficas excelentes já foram realizadas sobre os grupos desta região, que se tornou importante para a antropologia com o interesse renovado pelo xamanismo a partir da década de 1960. Assim, posso citar Michael Harner (1972) e seu trabalho sobre os Jívaro; Ken Kensinger (1973) e os Kaxinawá; Scott Robinson (1970) e os Kofán e Marlene Dobkin de Rios (1972) com os mestiços do Peru, entre outros. As pesquisas destes antropólogos foram pioneiras na exploração do papel de psicointegradores na história humana, e eu, como tantos outros, faço parte do processo de continuação deste interesse após os anos de 1970.


Barbara Keifenheim
  Os índios Kaxinawá, cuja práxis alucinógena é o ponto central deste meu estudo, pertencem à família etnolingüística dos índios Pano e vivem na região fronteiriça entre o Peru e o Brasil. Sua população é estimada em aproximadamente 4.600 pessoas (ISA 1996). Em minhas pesquisas de campo, realizadas regularmente desde 1977, concentrei-me exclusivamente nos Kaxinawá do lado peruano. Estes são descendentes de um ramo da etnia, que, no final do auge da exploração da borracha fugiram para a região da nascente do rio Curanja e evitaram qualquer contato com o mundo exterior até final dos anos 1940. Ainda que hoje tenha se completado um processo de assimilação à sociedade peruana, estes Kaxinawá aproveitam seu isolamento geográfico para viver relativamente livres de uma influência externa maciça, em comparação a outros grupos indígenas.
  Ao contrário do que acontece em diversos grupos indígenas amazônicos e em outros grupos Pano, entre os Kaxinawá a utilização de alucinógenos não está associada forçosamente à práxis xamãnica. Para a sua interação com os espíritos, os xamãs Kaxinawá utilizam preferencialmente o tabaco (dume). Somente em casos excepcionais, quando seus métodos não alcançam a cura almejada, é que eles bebem a droga nixe pae em sessões especiais para dialogar com os espíritos. E já que o modelo interpretativo do xamanismo não dá conta do caso Kaxinawá, aqui a questão do sentido e do significado da práxis alucinógena demanda uma outra abordagem. Nos últimos anos, minhas pesquisas evidenciaram que, para alcançar uma compreensão mais profunda deste processo, é imprescindível levar em conta os conceitos indígenas do ver e do visualizar, bem como a integração destes conceitos num complexo universo da percepção. Em outro trabalho, demonstrei detalhadamente como certos conceitos culturais específicos - como o da transformação, da ilusão da realidade externamente perceptível, da existência de múltiplas realidades, da interferência do visível e do invisível, da representação da forma como metamorfose “congelada” etc. - revelam-se como dispositivos igualmente estruturados e estruturantes, que contribuem para a construção das interpretações indígenas específicas das experiências da percepção (Keifenhelm 2000).
  Simultaneamente, comprovei, em nível praxeológico e conceitual, o significado central epistêmico atribuido pelos índios Kaxinawá aos processos de transformação visual, que São Vivenciados em sua plenitude numa experiência sinestésica. Sob a perspectiva dos Caxinawá, as experiências visuais liminares - que em geral podem ser relacionadas tanto a sonhos, delírios febris, comas e alucinações, quanto a certos modos de Contemplação de padrões ornamentais - permitem participar da metamorfose continuamente possível de formas e dimensões. Através deste processo de participação, por meio da auto-experiência sensorial-corporal, manifestam-se os princípios mitológico-cosmológicos coletivos.
  Neste artigo, vou abordar o ritual de droga nixi pae como um dos contextos privilegiados nos quais é rompida a ordem de percepção e de sentido cotidiana. O foco de minha atenção consiste basicamente nas alterações da percepção que ocorrem neste processo. Aqui, o meu interesse não é orientado por questões de caráter nem neurofisiológico, nem sensorial-científico ou perceptual-psicológico. No centro da minha análise encontram-se os discursos indígenas sobre experiências alucinógenas. Em seu fundamento, e a partir da minha observação de muitas sessões de drogas, serão analisados os processos de percepção desde as modalidades sensoriais cotidianas, até a experiência sinestésica.

02/11/2007

Trecho do Capítulo V do livro Porque Sou Espírita, de Américo Domingos, com refutações as acusações do padre Estevão Bittencourt ao Espiritismo no livro "Por que não sou espírita?

O quarto argumento trata-se de “O Conceito de inferno...”. O padre diz o seguinte: “Muitas vezes a má compreensão do que seja o inferno leva a rejeitá-lo em favor do reencarnacionismo. Na verdade, o inferno não é um tanque de enxofre fumegante atiçado por diabos munidos de tridentes, mas é um estado de alma, no qual o indivíduo se projeta por dizer NÃO a Deus: após a morte, a pessoa que morre consciente e voluntariamente avessa a Deus, é respeitada em sua opção definitiva, mas não pode deixar de reconhecer que Deus é o Sumo Bem... e o Sumo Bem que continua a amá-la irreversivelmente. É o fato de que Deus ama uma vez por todas, mas foi conscientemente preterido em favor de bagatelas, que causa o tormento do réprobo. Se Deus desviasse do réprobo o seu amor, ele não sofreria o inferno; mas Deus não pode deixar de amar, porque Ele não se pode contradizer. É precisamente nisto que está o princípio do inferno. Vê-se assim que o inferno, longe de contradizer o amor de Deus, decorre, de certo modo, da grandeza divina desse amor”.

Se o Sumo Bem que é Deus ama irreversivelmente aos seus filhos, sabendo da ignorância de que se acham revestidos os que se encontram avessos a ELE, não pode de forma alguma respeitar a “opção definitiva da negação”, deixando a grande esmagadora maioria da Sua criação ser condenada por todo o sempre. Exatamente por não poder deixar de amar, Deus concede a todos a eternidade do perdão. O “tormento do réprobo” é a consciência do espírito remoendo no Plano Extrafísico, oprimindo-o, recriminando-o. Devido a aparência de prolongar-se indefinidamente, o sofrimento do autojulgamento é denominado de “fogo eterno”. Na realidade, é o “fogo do remorso”. O Mestre Jesus antecipadamente, pôs por terra esse conceito dogmático, com os seguintes ensinamentos, contidos nos versículos a seguir:

1) Certa feita, um discípulo de Jesus perguntou ao Mestre: “Senhor, até quantas vezes meu irmão pecará contra mim, que eu lhe perdoe? Até sete vezes? Respondeu-lhe o Cristo: Não te digo que até sete vezes, mas até setenta vezes sete”. (Mt. 18:21-22)

Incomensurável é o amor de Deus, perdoando sempre o filho infrator às suas leis;

2) “Qual dentre vós é o homem que se porventura o filho lhe pedir pão, lhe dará pedra? Ou se lhe pedir peixe, lhe dará uma cobra? Ora se vós, que sois maus, sabeis dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais vosso Pai, que está nos Céus...” (Mt. 7:9-11)

Se um pai não castiga eternamente ao seu filho, como pode Deus punir um fruto da Sua criação por todo o sempre?

3) Em Mateus 5:25-26: “Entra em acordo sem demora com o teu adversário, enquanto estás com ele a caminho, para que o adversário não te entregue ao juiz, o juiz ao oficial de justiça e sejas recolhido à prisão. Em verdade te digo que não sairás dali enquanto não pagares o último centavo.”

O Mestre, peremptoriamente, arrasa com o conceito do inferno, dizendo que a prisão é transitória, a pena não é perpétua. Através do “nascer de novo”, as dívidas serão resgatadas, pagando-se o último ceitil. Daí o Cristo ter dito a Nicodemos que todos teriam que reencarnar: “Importa-vos nascer de novo” (João 3:7)

4) “Jesus visitou e pregou aos espíritos em prisão” (1 Pedro 3:19)

Este versículo liquida inteiramente com o chamado “Suplício Eterno”, porquanto o Mestre foi visitar aos que estavam em sofrimento desde o tempo de Noé (1 Pedro 3:20). O ato de visitar e pregar, explicitamente derruba a possibilidade de existência do inferno, porquanto o Cristo foi às regiões inferiores do Plano Espiritual para pregar, isto é, difundir uma doutrina, propagar idéias virtuosas, preconizar a melhoria espiritual de outrem. Certa feita, quando jovem, praticante do protestantismo, abordei o pastor da igreja que freqüentava, a respeito desse versículo. O reverendo teve a petulância de dizer-me que o Mestre foi ao inferno mostrar a Sua glória para os que lá estão definhando por todo o sempre. Com assaz infelicidade, o “pastor de almas” enquadrou Cristo como um vulgar sado-masoquista, felicitando-se com o sofrimento alheio. Anteriormente, no meu tempo de infância, professava o Catolicismo. Lembro-me que quando indaguei, do sacerdote que ministrava as aulas de Catecismo, o seguinte: – Padre, se eu for para o céu e minha genitora para o inferno, como me comportarei no paraíso, sabendo que minha mãe está sofrendo? O prelado foi muito infeliz e cruel na resposta, dizendo-me que os eleitos esquecem o que foram na Terra. De imediato, redargüi, afirmando-lhe não acreditar que Deus possa fazer uma lavagem cerebral nos que entram no Éden eterno.

Logo me afastei dessa religião, que prega existir nenhum sentimento de piedade e de caridade, subsistindo naqueles que se encontram na beatitude celestial. Inclusive a Summa Theologia de S. Tomás de Aquino; suplemento da parte III, quest. 95, arts 1, 2 e 3, edição de Lião, 1685, T-II, pag. 425, traz a seguinte aberração:

“Os eleitos, no céu, não conservam sentimento algum de amor e amizade pelos réprobos; não sentem por eles compaixão alguma e até gozam do suplício de seus amigos e parentes. Os eleitos o gozam no sentido de que se sentem isentos de torturas, e que, por outro lado, neles terá expirado toda compaixão, porque admirarão a justiça divina” (Retirado do livro Cristianismo e Espiritismo, pag. 247, 6.a edição, FEB).

5) No Antigo Testamento, no livro de Isaías, capítulo 57, versículo 16, está bem claro que não existe condenação eterna: “... não contenderei para sempre, nem me indignarei continuamente, porque, do contrário, o espírito definharia diante de mim e o fôlego da vida que eu criei”.

6) A seguinte passagem do Evangelho nos revela que o sofrimento, após a morte física, é padecido com diferenciação e tem finalidade corretiva: “Aquele servo, porém, que conheceu a vontade de seu senhor e não se aprontou, nem fez segundo a sua vontade, será punido com muitos açoites. Aquele, porém, que não soube a vontade de seu Senhor e fez coisas dignas de reprovação, levará poucos açoites” (Lc. 12:47-48) O “inferno”, além de não ser eterno, não é o mesmo para todos os pecadores. O próprio Jesus esclarece esta questão, em continuação ao versículo 48: “Mas àquele a quem muito foi dado muito mais lhe pedirão”. Portanto, os espíritos, que reencarnam com conhecimentos espirituais, ou que os adquirem na presente existência, já não sendo mais “porcos para quem não devam ser lançadas pérolas, nem cães para os quais as coisas santas não devam ser dadas” (Mt. 7:6), têm grande responsabilidade e são mais culpados, diante do insucesso na existência física, levando ao “inferno do remorso” (muitos açoites), que os outros espíritos que falharam, sem o conhecimento prévio das coisas espirituais, com o remorso remoendo menos (poucos açoites), já que não tinham idéia precisa do mal em que incorreram. 'Na verdade, existem inúmeros estados de sofrimentos, como inúmeros são nossos erros, porém os erros de uma única existência, jamais poderiam justificar o sofrimento por toda a Eternidade. Se o ser está lesado em seu espírito, devido ao mau procedimento em vida passada, vivendo intenso sofrimento espiritual (fogo eterno), é necessário que reencarne, marcando no corpo físico a sua deficiência, tendo a oportunidade da cura total, através do seu procedimento diante do resgate, expurgando do corpo espiritual a chaga que o maltratava. No decurso de existências sucessivas, o espírito se vai aprimorando e tornando-se apto, através da evolução espiritual, de compreender e habitar o Universo. A Espiritualidade, por intermédio das Escrituras, nos revela a grandiosidade da lei da reencarnação, que permite o nosso aprimoramento, em época certa, quando já teremos “olhos para ver” e “ouvidos para ouvir”, (Mt 11:15). Tudo realmente tem uma causa e fomos criados para a ventura eterna. Com o pensamento voltado para o oceano de galáxias, revelando a grandiosidade da criação, ouvimos, no nosso íntimo, as palavras do representante maior da Divindade, em nosso planeta: “Na casa de meu Pai há muitas moradas...” (Jo. 14:2). O Universo espelha a eternidade de nossos espíritos e nos mostra que o seu Autor, sendo Onisciente e, produzindo uma obra tão gigantesca e maravilhosa, não erraria ao ponto de permitir o “inferno eterno” e deixar que o fruto de Sua Criação, “feito à sua imagem e semelhança” – (Gênesis 1:27), perecesse para todo o sempre. Sem reencarnação só restam o caos e a desesperança (retirado do capítulo “Inferno Eterno ou Reencarnação”, do livro A Queda dos Véus, publicado pelo Centro Espírita Léon Denis, do mesmo autor, Américo Domingos Nunes Filho).

Os católicos nos criticam (e também aos protestantes) por não aceitarmos os Papas como sucessores de Pedro e inspirados pelo Espírito Santo.

Vejamos os argumentos usados por eles:

"Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela" (Mateus 16:18)

Na Epístola aos Efesios, Cap II, v.20, está escrito claramente que a Igreja está fundamentada sobre a fé dos apóstolos e Profetas, sendo Jesus Cristo a principal pedra do angulo. S. Cirilo escreveu: "A rocha ou pedra de que nos fala Mateus, é a fé imutável dos apóstolos". S. Crisóstomo quando, em sua homilia 56 a respeito de Mateus, escreve: "Sobre esta rocha edificarei minha igreja: e esta rocha é a confissão de Pedro."

E qual foi a confissão de Pedro?

Está no versículo 16: "Tu es Cristo, o Filho de Deus vivo".

Santo Agostinho se expressa assim sobre a Primeira Epistola de S. João: "Edificarei minha igreja sobre esta rocha, significa claramente que é sobre a fé de Pedro".

No seu tratado 124 sobre o mesmo S. João, encontra-se essa frase: "Sobre esta rocha, que acabais de confessar, edificarei minha igreja; e a rocha era o próprio Cristo, filho de Deus".

Tanto esse santo não acreditava que a Igreja fosse edificada sobre São Pedro, que disse em seu sermão no 13:

"Tu és Pedro, e sobre esta rocha ou pedra que me confessaste, que reconheceste, dizendo: Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo, edificarei a minha igreja, sobre mim mesmo; pois sou o Filho de Deus vivo. Edificarei sobre mim mesmo, e não sobre ti."

Haverá coisa mais clara??

Dizem as escrituras que Cristo até proibiu Pedro e seus colegas de reinarem ou exercerem senhorio (Lucas, XXII, 25 e 26). Cristo prometeu tronos aos apóstolos (Mateus, Cap. XIX, v. 28), sem dizer que o de Pedro seria mais elevado que os dos outros.

Os concílios do quatro primeiro séculos nunca deram, nem reconheceram o poder e a jurisdição que os bispos de Roma queriam ter.

Claro que Pedro, depois de Jesus desencarnar, seria o ponto de partida para as futuras pregações evangélicas. E assim, depois da crucificação, vamos encontrar Pedro em Jerusalém, como centro irradiador de forças espirituais e de ensinamentos para o Cristianismo nascente. E mais tarde, ao lado de Paulo em Roma, Pedro articula os trabalhos evangélicos que se desenvolviam na grande cidade, trabalhando fielmente até cair vítima da perseguição. Atendendo à sua fé franca e sincera e ao seu espírito ponderado e humilde com muita coragem de lutar, Jesus confia a Pedro a orientação dos primeiros passos do Cristianismo e a direção dos primeiros trabalhos da disseminação do Evangelho.

Mas onde está escrito que Pedro teria sucessores, escolhidos pelos homens, e que esses sucessores viveriam da religião e não para a religião? Onde diz que os sucessores seriam considerados infalíveis e seriam chamados "santidade"? Não disse isso, nem que os padres seriam sucessores dos apóstolos com poder de perdoar pecados. Disse que apóstolos perdoassem, pois esses eram médiuns, estavam preparados, sabiam reconhecer quem tinha realmente fé, quem estava realmente transformado e merecia ser perdoado, como fazia Jesus, inclusive CURANDO os enfermos após perdoar, obviamente livrando eles das enfermidades causadas pelos pecados de que agora eram perdoados.

É um absurdo comparar o exemplo de humildade e luta de Pedro com os Papas ao longo da História. Pedro jamais aceitaria o título de "Santidade", muito menos ser considerado infalível. Maior absurdo ainda dizer que o Papa é representante de Jesus ou Deus (o que para os católicos e evangélicos é a mesma coisa) na Terra. Só podemos considerar isso como uma enorme PRESUNÇÃO. Cristo disse: "O filho do homem não tem uma pedra para reclinar a cabeça, embora as aves do céu tenham seus ninhos e os lobos tenham os seus covis". Nasceu numa manjedoura, num lugar modesto, numa gruta. Morreu na cruz. Toda a sua vida foi muito simples. Ele é o chefe da Igreja Católica. Não mais do que isso. O século IX é conhecido pelos escândalos pontificiais. O tempo em que os papas, sanguinários e mundanos, eram designados por mulheres dissolutas, como Teodora e Marozzia. O Papa Gregório, o Grande, condenou o culto aos ídolos e Bonifácio III e IV restabeleceram o mesmo culto. Quais destes era mais infalível e inspirado pelo Espírito Santo?

No início do século V, o padre João de Hussinec, mártir e herói nacional da antiga Checoslováquia, reitor da Universidade de Praga, foi mandado pra fogueira pela Igreja, por causa dos seus trabalhos negando a autoridade do Papa, censurando os vícios do clero, as indulgências, etc. Apelam os católicos para o fato de Jesus ter prometido assistência para sua Igreja e que as portas do inferno não prevaleceriam contra ela. Mas Jesus certamente não foi conivente com os absurdos cometidos pela Igreja Católica ao longo da História. Sua Igreja é a de "um só rebanho e um só pastor", e não exclusivamente a Católica ou uma das diversas igrejas evangélicas, cada uma delas dizendo ser a Verdade. Jesus falava da VERDADEIRA IGREJA DO CRISTO, a que leva a reforma íntima, a transformação do indivíduo e, por fim, de toda a Humanidade. O inferno não prevalecera contra os que colocarem seus ensinos em prática, e não os dessa ou daquela Igreja.

Jesus não criou uma Igreja com uma hierarquia baseada em valores materiais, e sim espirituais.

Do livro "O Espiritismo e as Igrejas Reformadas", de Jayme Andrade, um ex-protestante:

"1 - Como pode Deus criar a luz antes do Sol? – (Gênesis 1:3 14). Como separou Ele a luz das trevas (Gênesis 1:4), se estas nada mais são do que a privação da luz? Como fez o dia antes que o sol fosse criado?

2 - Como afirmar que do Éden saia um rio que se dividia em outros quatro, um dos quais, o CIOM, que corria no pais de Cuse (Etiópia) (Gênesis, 2:13) só podia ser o Nilo, cuja nascente distava mais de mil léguas da nascente do Eufrates?

3 - Por que a proibição de comer do fruto da “árvore da ciência do bem e do mal” (Gênesis 2:17), se é fato que, dando a razão ao homem, Deus só poderia encoraja-lo a instruir-se? Acaso preferia Ele ser servido por um tolo?

4 - Por que se atribuiu a serpente o papel de Satã (Apoc. 12:9), se a Bíblia apenas diz que “a serpente era o mais astuto dos animais” (Gênesis 3:1)? Que língua falava essa serpente, e como andava ela antes da maldição de que passaria a arrastar-se sobre o ventre e comer pó? (Gênesis 3:14) E como explicar a desobediência da serpente, se nunca se ouviu falar de cobra que comesse pó? E como explicar que tantas mulheres possam hoje dar a luz sem dor e tantos homens comam o seu pão sem precisarem de suar o rosto? (Gen. 3:16/19)

5 - Como pode ser punido com tanto rigor um ente primitivo como Adão, que não sabia discernir entre o bem e o mal? (e a prova disso se encontra no verso 22: 'Eis que o homem é como um de nós, sabendo o bem e o mal'). Caim cometeu um fratricídio e não mereceu uma pena tão severa; a despeito da maldição: “Fugitivo e vagabundo será na Terra” (Gênesis 4:12) foi para Node, onde constituiu família e até construiu uma cidade (Gênesis 4:17) e “seus descendentes foram mestres em varias artes” (Gênesis 4:20/22)

6 - Os teólogos pretendem que a morte entrou no mundo em conseqüência do pecado de Adão (pelo menos este é o ensino de Santo Irineu no 1o Século, confirmado por Santo Agostinho). Pergunta-se: como estaria hoje a população da Terra se a humanidade só fizesse nascer? E por que a punição teve de se estender aos animais, que nada tiveram a ver com o pecado de Adão?

7 - Como poderam encerrar “casais de todos os animais da Terra” (Gênesis 6:19) numa arca de 300 côvados (198 m) de comprimento por 50 de largura e 30 de altura (Gênesis 6:15) ? Como conseguiram apanhar todos esses animais e reunir tantos e tão variados alimentos e de que modo se houveram as 8 pessoas a bordo (Gênesis 7:13) para alimentar todos eles (e limpar todos os dejetos) durante mais de um ano? Note-se que o diluvio começou a 17 do 2o mês (Gênesis 7:11) e os que nela haviam entrado sete dias antes (Gênesis 7:10) só saíram da Arca a 27 do segundo mês (do ano seguinte é obvio) (Gênesis 8:14)

8 - Se Deus é justo e se foi Ele próprio que endureceu o coração do Faraó para que não permitisse a saída dos israelitas (Êxodos 11:10), por que teria de matar todos os primogênitos do Egito, inclusive muitos milhares de inocentes crianças e até os primogênitos de todos os animais? (Êxodo 12:29)

9 - Como teriam os magos egípcios transformado a água do Nilo em sangue (Êxodo 7:22), se Moisés já o fizera antes? (Êxodo 7:20). E como puderam perseguir os israelitas com o seu exercito desfalcado de todos os primogênitos (Êxodo 12:29) e empregando a sua cavalaria (Êxodo 14:23), se na 5.a praga haviam sido mortos todos os cavalos? (Êxodo 9:6)

10 - Se o mar tragou todo o exercito do Faraó, este inclusive (Êxodo 14:28) não é de se estranhar que com a decifração dos hieróglifos, que permite hoje conhecer toda a história do antigo Egito, não se tenha encontrado uma só referência a tão espantosa calamidade?

11 - Como entender que os autores do Antigo Testamento, tão precisos ao citar pelos nomes dezenas de pequenos reis das cidades vencidas, como Adonizedeque (Josué 10-1), Hoão, Pira, Zafia, Debir (Josué 10:3), Hoão (Jos. 10:33), Jabim, Jobab (Josué 11:1), Seom (Josué 12:2), Igue (Josué 12:4), Jeeb (Juizes 7:25), Salmuna e Zeba (Juizes 8:5), Agag (I Samuel 15:8), Aquis (I Samuel 21:10), etc., não tenham mencionado o nome do Faraó que reinava ao tempo da fuga dos israelitas, o qual é citado tantas vezes nos primeiros 14 capítulos do livro de Êxodo?

(...)

14 - Como entender que fossem eleitos e protegidos por Deus assassinos como Eude, que apunhalou a traição o rei Eglom (Juizes 3:21), Davi, que fez morrer Urias, para tomar-lhe a mulher (II Samuel 11:15) e Salomão, que tendo 700 mulheres e 300 concubinas (I Reis 11:3), mandou matar seu irmão Adonias só porque este lhe pedira uma? (I Reis 2:21 e 25)

(...)

A história de todos os povos está repleta de lendas, crendices, mitos, alegorias, superstições. Por que a dos judeus teria que ser diferente? Quando o historiador pertence a outra comunidade, ou se encontra afastado dos acontecimentos no tempo e no espaço, ainda se pode esperar alguma imparcialidade. Mas, se quem narra a historia é um dos próprios interessados, é natural que procure exagerar os feitos dos compatriotas, sejam contemporâneos ou antepassados, e subestimar os dos seus adversários. Isso ocorre até nos tempos atuais, em que os eventos ficam registrados na imprensa, em livros, nos filmes, nas fitas de vídeo, etc.

Mesmo fatos contemporâneos, amplamente divulgados e documentados por todos os meios de registro disponíveis, se prestam a interpretações diferentes, ao sabor das conveniências de cada grupo. A paternidade do avião, inventado já no início deste século, não é atribuída pelos norte-americanos aos irmãos Wright, com evidente indiferença aos méritos do nosso Santos Dumont? Imagine-se o que não ocorreria nos tempos primevos, quando os acontecimentos eram transmitidos por tradição oral, e só muito depois vinham a ser registrados por escrito...

(...) Não há evidente exagero em afirmar que os israelitas num só dia mataram 100 mil sírios? (I Reis 20:29). A nosso ver, cem mil homens não morrem num só dia nem com as mais devastadoras armas modernas. Com as bombas nucleares existe a possibilidade, mas até o momento não nos conta tenha de fato ocorrido. As lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki em 6 e 9-8-45 não chegaram a exterminar tanta gente, pelo menos não no primeiro dia. E note-se que não foram arremessadas contra exércitos aguerridos, mas contra populações civis. Se com os recursos altamente sofisticados da tecnologia atual a empresa não é fácil, imagine-se o que não seria nos tempos em que as armas mais letais eram espadas e lanças, e os veículos mais velozes eram carros puxados por cavalos e camelos...

Pela mesma razão não nos parece muito verossímil que o "Anjo do Senhor" tenha numa só noite exterminado 180 mil assírios (II Reis 19:35), nem que 120 mil “midianitas” tenham sido mortos pelos 300 de Gedeão (Juizes 8:10), nem que os judeus tenham eliminado em um só dia 120 mil da tribo de Judá, “todos homens poderosos, por terem abandonado o Senhor Deus de seus pais” (II Crônicas 28:6), e ainda levado cativas 200 mil mulheres e crianças do seu povo irmão (II Crônicas 28:8). E o que dizer dos “500 mil homens escolhidos que caíram feridos em Israel” (II Crônicas 13:17). E o que dizer do 1 milhão (1 milhão!) de etíopes que 'foram destroçados sem restar nem um sequer' ? (II Crônicas 14:9 e 13). Será que a Etiópia já dispunha naquele tempo de 1 milhão de habitantes? (nota no rodapé da página: Temos duas bíblias traduzidas Almeida, ambas editadas pela Sociedade Bíblica Brasileira, com redação diversa do cap. 13. A de 1966 diz como esta acima. A de 1969 (edição revista e CORRIGIDA) reza: “caíram tantos etíopes que já não havia neles vigor algum”... Veja-se como vão aos poucos alterando o texto!)

(...) jamais nos passaria pela idéia o intuito de amesquinhar o papel da Bíblia como regra de fé da Cristandade, e nem seriam pigmeus como nós que ousariam tão inexeqüível tarefa. Sabemos e proclamamos que ela é o fanal de todos os povos cristãos, e que os preciosos ensinamentos morais nela contidos brilharam e continuarão a brilhar por muitos séculos concorrendo para dissipar as trevas da ignorância dos homens sempre que eles estiverem a altura de os assimilar. Aquilo que unicamente contestamos é a tese da “inerrancia” da Bíblia, a idéia de que ela encerra toda a Verdade e de tudo quanto contém é a palavra saída dos lábios do próprio Deus. O que afirmamos é que a Bíblia foi escrita por homens e por isso mesmo esta repleta de falhas resultantes da imperfeição humana. Pretender que ali esteja a Verdade como um bloco monolítico, é semear confusão na mente de homens que já aprenderam, ou pelo menos deviam ter aprendido, a raciocinar."

Católicos e Protestantes nos criticam por não crermos na Bíblia como a Palavra de Deus inquestionável. Realmente, damos importância apenas a Jesus, pois nada há de útil no Velho Testamento para os dias de hoje, exceto os Dez Mandamentos. O próprio Jesus afirmou: “Respondeu-lhe Jesus: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a lei e os profetas.” (Mateus 22:37-40)

No Sermão da Montanha, Jesus revogou algumas coisas do Antigo Testamento, retificando o que era humano nas leis mosaicas: “Ouvistes que foi dito: olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo...” (Mateus 5:38 a 42) “Ouvistes o que foi dito: amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. Eu, porém, vos digo: amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem.” (Mateus 5:43 e 44)

Paulo também disse: “Com efeito: Não adulterarás; não matarás; não furtarás; não cobiçarás; e se há algum outro mandamento, tudo nesta palavra se resume: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo.” (Romanos 13:9)

O que aí não se inclui, são quinquilharias humanas. Jesus não trabalhou aos sábados; não permitiu que apedrejassem a adúltera; foi contra o divórcio, contrariando Moisés, pois, afinal, eram leis de Moisés, leis para doutrinar aquele povo, e não leis divinas, que nunca se alteram. A expressão “a palavra de Deus” é de origem judaica. Foi naturalmente herdada pelo Cristianismo, que a empregou para o mesmo fim dos judeus: dar autoridade à Igreja. A Bíblia, considerada a "palavra de Deus", reveste-se de um poder mágico: a sua simples leitura, ou simplesmente a audiência dessa leitura, pode espantar o Demônio de uma pessoa e convertê-la a Deus. Claro que o Espiritismo não aceita nem prega essa velha crendice, mas não a condena. A cada um, segundo suas convicções, desde que haja boa intenção. As pesquisas históricas revelam que os livros que compõem a Bíblia tem origem na literatura oral do povo hebreu. Só depois do exílio na Babilônia foi que Esdras conseguiu reunir e compilar os livros orais (guardados na memória) e proclamá-los em praça pública como a lei do judaísmo, ditada por Deus. É impossível provar que "de capa a capa" a Bíblia é divinamente inspirada. O "credo quia absurdum" (acredito mesmo que absurdo) é fruto do dogmatismo, criação humana dos concílios, enquanto o Espiritismo é a doutrina do livre-exame e consiste na fé raciocinada, apta a "encarar a razão face a face em todas as épocas". Somente às religiões dogmáticas, que se apresentam como vias exclusivas de salvação, interessa o velho conceito da Bíblia como palavra de Deus. Primeiro, porque esse conceito impede a investigação livre. Considerada como a palavra de Deus, a Bíblia é indiscutível, deve ser aceita literalmente ou de acordo com a "interpretação autorizada da igreja". Por isso, as igrejas sempre se apresentam como "autoridade única na interpretação da Bíblia". Segundo, porque essa posição corresponde aos tempos mitológicos, ao pensamento mágico, e não a era de razão em que vivemos.

Há contradições insanáveis em que se afundam os hermeneutas religiosos. Vêem-se eles obrigados a perigosas ginásticas de raciocínio, apoiadas em fórmulas pré-fabricadas, para se safarem das contradições do texto. Mas não escapam jamais a contradição fundamental que é esta: consideram a Bíblia como a palavra de Deus, mas estabelecem, para sua interpretação, regras humanas. Dessa maneira, é o homem que faz Deus dizer o que lhe interessa. As supostas condenações do Espiritismo pela Bíblia, por exemplo, decorrem das interpretações sacerdotais, até alterando os textos, moldando a "Palavra de Deus" segundo suas conveniências. A Bíblia é um dos maiores repositórios de fatos espíritas de toda bibliografia religiosa. E os textos bíblicos estão eivados de passagens tipicamente espíritas. (leia o item sobre a proibição bíblica a comunicação com mortos)

Emmanuel, trabalhador incansável do Cristo, através da psicografia de Francisco Cândido Xavier, nos diz: "O ato de crer em alguma coisa demanda a necessidade do sentimento e do raciocínio, para que a alma edifique a fé em si mesma. Admitir as afirmativas mais estranhas, sem um exame minucioso, é caminhar para o desfiladeiro do absurdo, onde os fantasmas dogmáticos conduzem as criaturas a todos os despautérios." (O Consolador, Ed. FEB, pág. 201)

Será mesmo que tudo na Bíblia tem inspiração divina? A despeito da expressa proibição: "Em ti não se achará quem faça passar pelo fogo seu filho ou a sua filha" (Deut. 18:10), os judeus de vez em quando queimavam seus filhos em sacrifício (II Reis 17:17) e até alguns reis cometeram esse crime hediondo, como Manasses (II Reis, 21:16) e Acaz (II Cron. 28:3), e até o grande libertador Jefté, que foi Juiz em Israel por seis anos, foi "cheio de espírito e ofereceu a sua filha em holocausto a Deus" (Juizes 11:29 e 39). Alguns textos levam a supor que os sacrifícios humanos tinham o beneplácito de Jeová, uma vez que "o homem consagrado a Deus nao poderá ser resgatado, será morto" (Lev. 27:29). Jeu, rei de Israel por 28 anos, matou 2 reis israelitas, Acazias e Jorão (II Reis 9:24-33), bem como toda a linhagem do ex-rei Acab, inclusive seus 70 filhos (II Reis 10:7) e mais 42 irmãos de Acazias (II Reis 10:14), além de inúmeros adoradores de Baal (II Reis, 10:25) e apesar de tão zeloso "não se apartou dos pecados do ex-rei Joroboão e nem destruiu os bezerros de ouro" (II Reis 10:29). Pois foi a esse rei idólatra e sanguinário que Jeová afirmou: "Bem obraste em fazer o que é reto aos meus olhos" (II Reis 10:30)

Samuel era vidente de Deus (I Samuel 9:19), mas mandou que o rei destruísse totalmente os amalequitas, "matando desde o homem até a mulher, desde os meninos até os de mama, desde os bois até as ovelhas e desde os camelos até os jumentos" (I Samuel, 15:3). Mas Saul poupou os animais e por isso foi castigado (I Sam., 15:26).

Moisés, que "era o mais manso de todos os homens que havia na Terra" (Num. 12:13), desce do Sinai com as "Tábuas da Lei", onde constava o mandamento "Não Matarás" e logo, para passar da teoria à prática, manda matar 3 mil dos seus compatriotas e ainda por cima pede a benção de Deus para os assassinos (Êxodo 32:28/29). Josué conquistou todas as cidades da prometida "Canaã destruindo totalmente a toda alma que nelas havia" (Jos. 10:35), "destruindo tudo que tinha fôlego, como ordenara o Senhor Deus" (Jos 10:42), o que não é de se admirar, uma vez que Jeová é "homem de guerra" (Êxodo 15:3).

"Cada um tome a sua espada e mate cada um a seu irmão, cada um a seu amigo, cada um a seu vizinho" (Êxodo 32:27) "Nenhuma coisa que tem fôlego deixarás com vida" (Deut."Se o povo de uma cidade incitar os moradores a servir outros deuses, destruirás ao fio de espada tudo quanto nela houver, até os animais" (Deut. 13:12/15) 20:16)

Nossa, até os inocentes animais!!

Veja também que havia diversos "Deuses", não só Jeová . Este, claro, era o "Deus" oficial do povo e, sob o seu nome, houve de fato manifestações de espíritos enviados por Deus. Isaías 8:19 também sugere a mesma coisa.

Está escrito em Deuteronômio, capítulo 21, versículo 23: "o que for pendurado em um madeiro é maldito de Deus". Logo, se Jesus passou por semelhante apróbio pode-se concluir que as "Escrituras Sagradas" estão denominando o Mestre de "maldito de Deus". Se a Bíblia não pode ser discutida para um cristão dogmático, como sair dessa??

Quando se tem acesso ao livro de Jonas, nota-se um paradoxo: "Deus" se apieda da cidade de Nínive, a grande inimiga de Israel, mandando o profeta Jonas pregar aos seus habitantes, em detrimento dos amalequitas, assassinados por ordem "divina", sem chance de arrependimento. Afinal, há preferência de "Deus" por alguns de seus filhos ? Portanto, que "Deus" é esse? Prejulga merecer o povo de Nínive a sua misericórdia, enquanto os amalequitas foram cruelmente assassinados por sua ordem;

Vemos em Levítico 21:16-24:

16Disse mais o Senhor a Moisés: 17Fala a Arão, dizendo: Ninguém dentre os teus descendentes, por todas as suas gerações, que tiver defeito, se chegará para oferecer o pão do seu Deus. 18Pois nenhum homem que tiver algum defeito se chegará: como homem cego, ou coxo, ou de nariz chato, ou de membros demasiadamente compridos, 19ou homem que tiver o pé quebrado, ou a mão quebrada, 20ou for corcunda, ou anão, ou que tiver belida, ou sarna, ou impigens, ou que tiver testículo lesado; 21nenhum homem dentre os descendentes de Arão, o sacerdote, que tiver algum defeito, se chegará para oferecer as ofertas queimadas do Senhor; ele tem defeito; não se chegará para oferecer o pão do seu Deus. 22Comerá do pão do seu Deus, tanto do santíssimo como do santo; 23contudo, não entrará até o véu, nem se chegará ao altar, porquanto tem defeito; para que não profane os meus santuários; porque eu sou o Senhor que os santifico. 24Moisés, pois, assim falou a Arão e a seus filhos, e a todos os filhos de Israel.

Raciocinem um pouco: um ato tão desumano de PRECONCEITO teria vindo do próprio Deus??

Também em Levítico, "Deus" não parece ser o grande Fisiologista, o Supremo Criador da natureza humana, desconhecendo que o processo da menstruação é natural, não podendo lhe ser imposto a pecha de imundo.

Assim está escrito: "Se um homem se deitar com uma mulher no tempo da enfermidade dela, e lhe descobrir a nudez, descobrindo a sua fonte, e ela descobrir a fonte do seu sangue, ambos serão eliminados no meio do seu povo". Menstruação é enfermidade? O próprio "Criador" desconhecendo o que criou? Um "Deus" preconceituoso, anatematizando uma função normal do aparelho sexual feminino? Ainda por cima, violento, ao ponto de expulsar o casal de seu povo? Em Deut. 13:6, 9 e 10, há uma ordem de matar a pedradas os adeptos de outras crenças. Uma apologia à intolerância religiosa. Em Levítico 22:17-18 "Deus" ordena que a oferta a ser oferecida no altar seja de animais sem defeito. E é mais exigente ainda, quando determina que não devam ser ofertados bichos que tiverem testículos machucados, ou moídos, ou arrancados, ou cortados (Levítico 22:24). Os sacrifícios de animais na Bíblia lembram bem o que acontece no Candomblé e Quimbanda nos nossos dias.

Paulo afirmou: "Vós recebestes a lei por mistérios dos anjos" (Atos 7:53), explicando ainda em Hebreus 2:2: "Por que a lei foi anunciada pelos anjos", e confirmando na mesma epistola, 1:14: "Espíritos são administradores, enviados para exercer o ministério". Também em Hebreus, (1:7) Paulo afirma: "o que faz os seus anjos espíritos e os seus ministros chamas de fogo". Está claro que os anjos são espíritos reveladores das leis de Deus aos homens, como afirma o Espiritismo. Paulo vai ainda mais longe, afirmando em Atos 7:30-31, que Deus falou a Moisés através de um anjo na sarça ardente. Os anjos são, portanto, espíritos, ministros de Deus, que os faz chama de fogo nas aparições mediúnicas.

Em Hebreus, 12:9, Paulo se refere a Deus como "Deus dos Espiritos". Houve casos estudados de manifestações de espíritos que eram na forma de línguas de fogo. Essas manifestações confirmam que os fenômenos de Pentecostes e o anjo da sarça ardente foram mediúnicos. O Espiritismo reconhece a ação de Deus na Bíblia, mas não pode admiti-la como a "Palavra de Deus". Na verdade, como ensinou o apóstolo Paulo, foram os mensageiros de Deus, os Espíritos, que guiaram o povo de Israel, através dos médiuns, então chamados profetas. O próprio Moisés era um médium, em constante ligação com Iavé ou Jeová, o deus bíblico, violento e irascível, tão diferente do Deus Pai do Evangelho. Devemos respeitar a Bíblia no seu exato valor, mas nunca fazer dela um mito, um novo bezerro de ouro. Deus não ditou nem dita livros aos homens.

Em Números, 11:23-25, temos a descrição de dois fatos mediúnicos valiosos. Primeiro, o Senhor fala a Moisés. Depois, Moisés reúne os setenta anciãos, formando uma roda, e o Senhor se manifesta materialmente descendo numa nuvem. Temos a comunicação pessoal de Jeová a Moisés, e a seguir o fenômeno evidente de materialização de Jeová, através da mediunidade dos anciãos, reunidos para isso na Tenda, cedendo ectoplasma para o fenômeno. A nuvem é a formação de ectoplasma na qual o espírito se corporifica. Só os que não conhecem os fenômenos espíritas podem aceitar que ali se deu um milagre, um fato sobrenatural. E podem aceitar, também, a manifestação do próprio Deus. Longe disso. Jeová era o espírito protetor de Israel, que se apresentava como Deus, porque a mentalidade dos povos do tempo era mitológica, e os espíritos eram considerados deuses. O filósofo Tales de Mileto já dizia, na Grécia, cinco séculos antes do Cristo: "O mundo é cheio de deuses". Os espíritos elevados eram considerados deuses benéficos, e os espíritos inferiores eram deuses maléficos. O Capítulo V do Deuteronômio é inteiramente mediúnico. Mas convém lembrar que os sucessos desse capítulo são melhor compreendidos quando lemos o Êxodo, caps. 18 a 20. Nos versículos 13 a 16, do capítulo 18, vemos Moisés diante do povo, para ser o mediador, o interprete – mas na verdade o médium –, entre Deus e o povo. Nos versículos 22 a 31, Cap. V, do Deuteronômio, temos uma bonita descrição de conhecidos fenômenos mediúnicos: o monte Horebe envolto em chamas, a nuvem de fluídos ectoplasmáticos (materializantes), e a voz-direta de Jeová. que falava do meio do fogo, sem se apresentar ao povo. E Moisés, como sempre, servindo de intermediário, na sua função mediúnica. Por fim, Jeová recomenda a Moisés que mande o povo embora, mas permaneça com ele, para receber as demais instruções. (Vers. 31, cap. 5 de Deut.)

No famoso cap. 18 de Deuteronômio, tão citado contra o Espiritismo, logo após os versículos das proibições, temos a promessa de Jeová, de que suscitará um grande profeta para auxiliar e orientar o povo. Como fazia com Moisés, o próprio Jeová promete que porá as suas palavras na boca desse médium. Não obstante, sabendo que todo médium está sujeito a envaidecer-se e dar entrada a espíritos perturbadores, Jeová determina que o profeta seja morto: "Se falar em nome de outros deuses". Esta passagem (vers. 20 do cap. XVIII) é mais uma confirmação bíblica do ensino espírita de que, naquele tempo, os espíritos eram chamados "deuses". Jeová era espírito-guia do povo hebreu, e por isso considerado como o seu Deus, o único verdadeiro. Mas os profetas (médiuns) de Jeová podiam receber outros deuses, como Baal, Apolo ou Zeus, pelo que a proibição bíblica nesse sentido é terrível e desumana, como podemos ver nos textos. A evolução espiritual do povo hebreu permitiria a Jesus vir corrigir esses abusos e substituir a concepção bárbara de Deus dos Exércitos pela concepção evangélica do Deus-Pai, cheio de amor com todas as criaturas. O Espírito que ditou os Dez Mandamentos a Moisés desempenhava uma elevada missão, preparando o povo hebreu para o monoteísmo, a crença num só Deus, pois os deuses da Antigüidade eram mitos. Através da mediunidade, ensinava aos homens rudes do tempo as verdades espirituais que deveriam frutificar no futuro. E por isso que encontramos, nas páginas da Bíblia, não só o relato de fenômenos espíritas ocorridos com o povo hebreu, mas também ensinamentos precisos e claros sobre a mediunidade. No Capitulo XII, do Livro de Números, vemos Jeová dar aos Hebreus uma das lições que só mais tarde apareceriam de novo, mas então no O Livro dos Médiuns, de Allan Kardec.

Mirian e Aarão falavam mal de Moisés, por haver ele tomado uma nova mulher, de origem cusita. Jeová não gostou disso e subitamente "desceu da nuvem", para repreende-los. Descer da nuvem é materializar-se, pois a nuvem é simplesmente a formação de ectoplasma, como a Bíblia deixa bem claro nos seus relatos. Imagina se o Senhor do Universo, o Deus-Pai do Evangelho, faria este papel de alcoviteiro!! Seria absurdo tomarmos este Jeová, sempre imiscuído nos assuntos domésticos, pelo próprio Deus! Como espírito-guia, podemos compreende-lo. E é como espírito-guia que ele repreende os maldizentes, castiga Mirian, mas antes ensina.

Primeiro, diz ele que pode manifestar-se aos profetas (médiuns) por meio de visão (vidência) ou de sonhos. Depois, lembrando que Moisés é o seu instrumento para direção do povo, esclareceu: "Não é assim com o meu servo Moisés, que é fiel em toda a minha casa". E acrescenta: "Boca a boca fale com ele, claramente e não por enigmas". Cinco formas de mediunidade figuram nesse ensino bíblico:

1) vidência;

2) a de desprendimento, ou sonambúlica;

3) a de materialização;

4) a de voz-direta;

5) a de audiência.

O próprio Jeová ensinava a mediunidade, como o apóstolo Paulo, em sua Primeira Epistola aos Corintios, ensinaria mais tarde a fazer uma reunião mediúnica.

Quem examinar com isenção o texto bíblico, observará que aquele Jeová do Antigo Testamento nada tem de comum com o Deus apresentado por Jesus no Novo.

Tudo faz crer que o protetor imediato da nação judaica era uma Entidade mais ou menos identificada com a índole guerreira da raça. Cada homem, cada povo, tem o Guia Espiritual que merece, compatível com o seu grau de evolução moral. Podia ser, talvez, um dos antepassados, com autoridade para impor seu domínio sobre os homens. Tais entidades, por atrasadas que sejam, não ficam ao desamparo da Espiritualidade Superior, mas é claro que esta não pode impor ensinamentos que os assistidos não estejam ainda em condições de assimilar. A evolução tem que vir naturalmente, sempre respeitando o livre-arbítrio de cada ser.

O mesmo ocorre ainda hoje, com os "pretos-velhos" e "orixás" que orientam os cultos africanos. Quando se dedicam ao bem, trabalhando em favor dos que sofrem, recebem assistência e orientação dos Espíritos elevados. Se preferem a prática do mal, tornam-se vitimas de entidades malévolas e ficam entregues a própria sorte até que, caindo em si, percebam a voz da consciência e, arrependidos, se voltem para Deus. O exame do Velho Testamento nos leva a duas alternativas: ou era o próprio legislador quem, com o propósito de infundir respeito, atribuía a Divindade todos aqueles rompantes de ferocidade de que o Antigo Testamento está repleto, ou Deus se fazia representar ante o povo por uma deidade tribal, talvez ate mais de uma, como se infere de Gen. 3:22: "Eis que o homem é como um de nós, sabendo o bem e o mal".

E a prova de se tratar de espirito ainda um tanto materializado é que "habitava no tabernáculo" (II Sam. 7:6), ou "de tenda em tenda" (I Cron. 17:5) e "se comprazia com o cheiro dos animais imolados em holocausto" (Números 29:36)

O Deus que amamos e adoramos não pode estar sujeito as paixões humanas. Não se concebe um Deus de infinita perfeição tomado de rancor, pronto a descarregar sobre suas criaturas a sua tremenda ira. E no entanto, embora Ele se diga "misericordioso e piedoso, tardio em se irar e grande em beneficência e verdade" (Êxodo 34:6), contam-se para mais de 60 acessos de cólera entre os livros Êxodo e II Reis.

O Jeová do Antigo Testamento, que deu ao seu povo o mandamento "não matarás", mandava exterminar os inimigos (e ate os amigos...) com incrível ferocidade. Como explicar tamanha contradição?

O apóstolo João afirmou: "Deus nunca foi visto por ninguém" (João 1:18) e "ninguém jamais viu a Deus" (I João 4:12), o que foi confirmado por S. Paulo: "(aquele) a quem nenhum dos homens viu nem pode ver" (I Timoteo 6:16) e pelo próprio Jesus: "Não que algum homem tenha visto o Pai" (João 6:46). Mas lemos no Antigo Testamento que Deus disse: "Eu apareci a Abraão, Isaac e Jaco" (Êxodo 6:3) e que Moisés, Arao, Nadib e Abiu e mais 70 anciãos viram Deus (Êxodo 24:9-11).

"Falava Deus a Moisés face a face, como qualquer homem fala ao seu amigo" (Êxodo"Não poderás ver a minha face, porque homem nenhum verá a minha face e viverá" (Êxodo 33:20) e em seguida abriu uma concessão: “ver-me-as pelas costas, mas a minha face não se vera” (Êxodo 33:23). E no entanto o próprio Deus afirmou: “Eu falo com Moisés boca a boca e ele vê a forma do Senhor” (Num. 12:8) e mais: “Cara a cara o Senhor falou conosco no monte, no meio do fogo” (Deut. 5:4) e "(Moisés) a quem o Senhor conhecera cara a cara" (Deut. 34:10). Finalmente, "Deus por duas vezes apareceu a Salomão" (I Reis 11:9). Afinal, Deus foi visto ou não? 33-11) e contudo o advertiu:

Afirmando que a Bíblia é a palavra de Deus, se baseiam nos versículos abaixo:

16Toda Escritura é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça; 17para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente preparado para toda boa obra. (II Timóteo 3)

Pois bem, a minha João F. de Almeida de 1948 diz: "Toda escritura divinamente inspirada é proveitosa para ensinar...".

Paulo se referia as escrituras que realmente são inspiradas, não considerando outras. E se fosse como querem, também seria uma contradição. Não dizem os católicos e protestantes que nem tudo é inspirado, e chamam de "apócrifos" livros que não constam em suas bíblias? Ainda por cima, a Bíblia protestante exclui livros que estão na Bíblia dos católicos... E gostaria de saber em que toda aquela guerra e, principalmente, aquela demonstração de PRECONCEITO contra deficientes físicos, poderia ser "proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça; para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente preparado para toda boa obra.". Não creio MESMO que Paulo estivesse falando de toda a Bíblia.

Outras argumentações dos que afirmam ser a Bíblia a "Palavra de Deus":

" Jesus:

a. leu-a (Lc 4:16-20);

b. ensinou-a (Lc 24:27);"

Mas também a resumiu em "Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo". Nós, espíritas, acreditamos que a Bíblia CONTÉM a Palavra de Deus, mas não é inteiramente a Palavra de Deus, infalível, inquestionável...

“Jesus afirmou que elas eram a verdade” (Jo 17:17);

Diz o versículo 14: "Eu lhes dei a tua palavra; e o mundo os odiou, porque não são do mundo, assim como eu não sou do mundo." Jesus se referia a palavra que Ele trouxe. Essa, sim, veio de Deus.

Jesus chamou-a "A Palavra de Deus" (Mc 7:13);

Novamente, não toda a Bíblia.

"Jesus viveu e procedeu de acordo com ela" (Lc 18:31);

"Tomando Jesus consigo os doze, disse-lhes: Eis que subimos a Jerusalém e se cumprirá no filho do homem tudo o que pelos profetas foi escrito;"

Se referia as profecias sobre o Messias, que se cumpriam com Ele.

"Declarou que o escritor Davi falou pelo Espírito Santo" (Mc 12:35,36);

Inspiração mediúnica (leia o item Espirito Santo)

"Jesus cumpriu-a (Lc 24:44). Jesus põe sua aprovação em todas as Escrituras do Antigo Testamento pois" Leis, Salmos e Profetas "eram as três divisões da Bíblia nos dias em que o Novo Testamento ainda estava sendo formado. "

"44Depois lhe disse: São estas as palavras que vos falei, estando ainda convosco, que importava que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos. 45Então lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras; 46e disse-lhes: Assim está escrito que o Cristo padecesse, e ao terceiro dia ressurgisse dentre os mortos;" (Lc 24:44-46)

Mais uma vez, se referia apenas as profecias a seu respeito.

"Em cada pessoa que aceita a Jesus como Salvador, o Espírito Santo põe em seu espírito a certeza quanto à autoria da Bíblia. É uma coisa automática. Não é preciso ninguém ensinar isso. Quem de fato aceita a Jesus, aceita também a Bíblia como a Palavra de Deus, sem argumentar."

Ora, isso é um convite a fé cega!

Em Jo 7:17, Jesus mostra como podemos ter dentro de nós o testemunho do Espírito Santo quanto a autoria divina da Bíblia: “Se alguém quer fazer a vontade de Deus . . .” .

14Estando, pois, a festa já em meio, subiu Jesus ao templo e começou a ensinar. 15Então os judeus se admiravam, dizendo: Como sabe este letras, sem ter estudado? 16Respondeu-lhes Jesus: A minha doutrina não é minha, mas daquele que me enviou. 17Se alguém quiser fazer a vontade de Deus, há de saber se a doutrina é dele, ou se eu falo por mim mesmo. 18Quem fala por si mesmo busca a sua própria glória; mas o que busca a glória daquele que o enviou, esse é verdadeiro, e não há nele injustiça. (João 7:14-18)

Mostra Jesus que não é Deus, mas um enviado de Deus, trazendo a palavra de Deus. E diz o óbvio: que devemos reconhecer o que é a sua palavra e a palavra de Deus, para procurar cumprir essa última. Não diz nada sobre a Bíblia ser divina.